Quanto mais velho a gente vai ficando, mais pessoas duras a gente vai conhecendo. Pessoas que já viveram perdas e danos, que já não possuem mais aquela alma lúdica e sonhadora de quando eram mais novas.
Isso é comum, faz parte da vida, do conceito de que nada é para sempre, de que nem tudo é como a gente quer. Mas, mesmo sabendo disso, e muitas vezes – e se não todas elas – a gente se esquece e endurece. Não por nossa culpa, mas pela falta de óleo. Óleo? Sim, óleo.
Percebi que entre o corpo e a alma existe uma espécie de óleo. Um óleo que lubrifica a alma, fazendo com que ela se torne leve, livre e solta dentro das pessoas. Que aqui, podemos chamar de lágrima. E, quando nascemos, o nível desse óleo é tão alto que, no primeiro contato com a “vida”, podemos dizer até que, pela maneira que somos erguidos, esse óleo transborda.
Aí a gente chora. Chorando o excesso vai embora e, em alguns segundos, o nível do óleo está exatamente perfeito. Tudo pronto. Tudo lubrificado. Zero quilômetro.
O tempo vai passando e vamos aprendendo o que é certo e o que é errado. O que faz bem e o que faz mal. Mas ninguém, nem a babá, nem a titia, nem a mamãe e nem mesmo a vovó, absolutamente ninguém, foi capaz de nos explicar que algumas coisas que fazem bem têm uma enorme tendência ou probabilidade de fazer mal. Aí a gente chora.
O nível de óleo já não é mais como era antes e vai baixando. Conhecemos alguém, passamos algum tempo felizes da vida. Esse alguém vai embora. Aí a gente chora.
O óleo ainda mais baixo. A alma já encontra alguma dificuldade de se movimentar. Coração apertado. Alma apertada.
Um acontecimento bom, um nascimento, uma promoção no trabalho, um título conquistado. Alma forte, se balança lá dentro, mostra quem manda no pedaço. Mas não com tanta facilidade. Na seqüência, outra decepção amorosa, outra perda, mais um dano, uma desilusão, um parente que vai embora. Aí a gente chora.
Nem chora tanto, mesmo porque o óleo já está quase no fim. As “coisas da vida vão acontecendo”. Coisas boas, coisas ruins, coisas não tão boas, coisas piores ainda. Aí a gente já nem chora tanto.
A luzinha do óleo já acendeu e, por precaução, a gente já nem chora mais. Aí a gente vai ficando duro. A alma, por sua vez, faz uma força danada lá dentro e… nada. A gente endurece, endurece cada vez mais. Indiferente a tudo.
Mas a alma, que não é boba nem nada, sabendo que aquilo não é para sempre, se esforça ainda mais, se debatendo dentro do corpo duro e apertado, de carne e osso ressecados. Um corpo cheio de si, mesmo. Ela continua tentando mostrar que é a vida e é assim mesmo. Mas a gente nem tchum. Nem aí para o que pode ser ou para o que pode não ser. Chega uma hora que a alma se cansa e vai embora.
Aí ninguém chora.
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