sexta-feira, 23 de setembro de 2011

No oceano de mim mesmo.

Tem momentos na vida da gente que parece o Saara. Você olha para todos os lados e nada. Não tem amigos, não tem parentes, não tem miragem. E são nesses momentos que a gente descobre mais sobre a gente. Sobre a nossa força interior. É quando quebra alguns condicionamentos. É bom quebrar condicionamentos. Daquilo que se faz, que se estuda que se dispõe a ir fundo. E é nessa hora que a gente para de bater os braços e coloca o pé para baixo para ver qual é a profundidade que chegamos que a gente descobre que não dá pé. E dá medo. E entre o pânico e a sanidade, a gente vê o quanto procuramos algo para apoiar. Um amigo, uma técnica, um mestre, um deus. Mas vê que não tem nada lá. Só a gente e a imensidão. Mas precisa se manter firme, mesmo com o coração na boca, pegar fôlego para continuar remando em busca do que ama. Do que acredita. De uma nova direção. E mudar incomoda. Não só quem muda, mas quem está acostumado com o nosso automatismo, também. Dói os braços. Mas faz bem. Diminui a gente. Engrandece o aprendizado. Cria musculatura. Coloca nossas certezas à prova. E é aí que a alma da gente vira do avesso. Oras, “alguns de nós escolhem viver graciosamente. Alguns podem ficar presos no labirinto e perder o caminho de casa. Esta é a vida a que pertencemos. Nosso divino dom”. Prefiro viver graciosamente, mesmo que as vezes tenha que me perder dentro do labirinto de mim mesmo. Porque no final das contas, vou encontrar o caminho de casa, de um jeito ou de outro. E quando parar de bater os braços e colocar os pés no chão para ver se vai dar pé, não precisar mais procurar algo para apoiar. Porque vou ter a certeza de que vai ter um Cara lá para segurar a minha mão. E então, não vou precisar mais me manter firme, nem pegar mais fôlego, nem bater mais os meus braços. Nunca mais.

sábado, 30 de julho de 2011

Tréquinho.

Você tem tudo. Tem uma boa saúde. Uma boa família. Uma boa casa. Um bom carro. Um bom marido. Mas tem algo que não está bom. “Não sei o que é. Algo que me incomoda, que, sei lá”. Então, você vai e compra roupas novas. Compra um carro novo. Uma casa nova. E tem até quem arruma um marido novo. Fica tudo melhor. Mas o tréquinho lá dentro de você continua incomodando. Que nem um inseto que fica rodeando a orelha da gente, sabe? E a gente tenta espantar com as mãos e ele torna a voltar. Então, lá vai você de novo. Compra roupas novas, pega um carro melhor, uma casa maior, ou uma na praia talvez. Tem mais um filho. E vai acumulando tranqueiras envolta de você. Acumulando coisas para tentar diminuir o ruído desse tréquinho aí dentro que não para de encher. Mais do mesmo, sempre mais do mesmo. E nunca está feliz. Se está é por um tempo. Um ano, dois, trinta anos talvez, mas dura pouco. O engraçado é que ninguém para pra prestar atenção nesse tréquinho que incomoda. Ninguém para um minutinho sequer para olhar para isso. Pra ver o que é, do que se trata, como chama ou o que significa esse tréquinho aí dentro. É mais fácil jogar coisas em cima dele para abafar o ruído. Bem mais fácil.
Mas tem gente que se enche dele e para pra prestar atenção. Sabe aquele negócio: “Se não pode vencê-los junte-se a eles”? Então. Aí ela vai lá, entre um relacionamento e outro, um carro maior e outro, entre os mais do mesmo, e para. E escuta...
... e se assusta. Porque... “Cadê o tréquinho que tava aqui? Disgramado!!! Ficou a vida inteira me atazanando e quando eu finalmente resolvo parar para escutá-lo ele some!!!”
Opa, mas peraí, também tem outra coisa aqui. Tem um frescor. Um silêncio gostoso. Que bom é isso. Nossa, quanto tempo eu não para. Não fico quietinho aqui comigo!
E aí percebe o quanto de coisas vem acumulando em volta de você. Quanto coisa inútil vem acumulando dentro de você. Coisas que não tem nada a ver com você. Podia até ter a ver com aquilo que você achava que era você. Mas não com esse você aí, de verdade.
Percebe que aquele trequinho que incomodava tanto era uma parte sua dizendo assim: “Hei, olha pra você, cara. Olha para o que você está fazendo com você. Você ainda se lembra de como você era? Lembra dos seus valores? Do que você acreditava? Quais eram seus sonhos quando era moleque? Ta aí na vida jogado. Correndo. Se anulando. Vivendo a vida de outras pessoas. Do pai, do marido, do filho, do chefe. Se liga, meu chapa.
Mas é raro quem dê ouvidos a si mesmo. Vai levando a vida, no sopetão. Fazendo. Correndo. Acumulando. Se anulando e vivendo a vida de outras pessoas. Para, no final das contas, olhar em volta e perceber que está cheio de tudo e vazio de si mesmo.

terça-feira, 1 de março de 2011

Tudo certo. E aí?

Depois de fadigar o meu corpo por quase uma hora, me sento em padmasana embaixo de uma árvore. Isso me ajuda a entrar mais rápido num estado meditativo. Fica mais profundo. Com os olhos fechados escuto as crianças brincando no parquinho ao fundo. Percebo pessoas passando atrás de mim. Cachorros, bicicletas, vozes. Vou interiorizando. A percepção das pessoas vai diminuindo. Aumenta a percepção do meu corpo. Do batimento cardíaco. Uma formiga anda sobre o meu corpo. Aproveito para voltar ainda mais a atenção para ele. Vou para dentro. Fundo. Cada vez mais fundo. Meus pensamentos agora fazem tanto barulho quanto lá fora. Muito barulho. Não dou bola. Fico apenas observando. Em alguns percebo me envolvendo emocionalmente. Mas vou me distânciando mais e mais. Quase nenhum pensamento. Apenas eu, meu corpo e minha respiração. Delícia. Impossível descrever a sensação. Mas é como se você entrasse num estado em que ficasse olhando para você mesmo, completamente dentro de você, consciênte de você. Livre de qualquer ansiedade, cobrança, preocupação com futuro, reponsabilidade ou qualquer coisa. Apenas ali, no que chamam de presente. Exceto por uma frase. Apenas uma insistente frase. Que permaneceu: Por que não dá certo? Por que não dá certo? E se repetia dentro da minha mente. Mas nesse momento eu já estava apenas como um telespectador olhando praquilo. Apenas olhando. E a palavra lá. Fiquei assim. Olhando. Sem sequer uma ansiedade ou possibilidade de resposta. Como se eu fosse um analfabeto olhando uma frase na lousa. Não sei quanto tempo se passou. Mas num instante a frase mudou para: Já deu certo. Nesse momento tive uma expansão da consciência e foi como se eu deslizasse para dentro de mim mesmo, dentro do meu sistema fisiológico. Como se eu pudesse ver claramente a complexidade dos orgãos, das glândulas, dos ossos, músculos, veias, sangue, e foi afunilando mais e mais. Vi os glóbulos no sangue, as células, as trocas celulares. Tudo impressionantemente rápido e claro, com uma lucidez incrível. E sem racionalizar a experiência, ou seja, ainda totalmente como telespectador. A resposta se fez exata, não na minha mente, mas no meu ser: Já deu certo. E como se não bastasse, mas para mim já havia bastado, da visão micro do organismo, fui para o oposto numa velocidade tão rápida quanto a primeira. Vi meu corpo sentado embaixo da árvore e fui subindo, vi o planeta onde esse corpo estava. Daí para outros planos que não ouso mencionar, fui para o momento da minha escolha, da decisão, do meu processo reencarnatório. Com um estouro de lucidez de tudo o que se passou para eu estar aqui, agora, nesse corpo, desse jeito, nesse lugar, com essas características, cores, pessoas, tudo, absolutamente tudo, per-fei-ta-men-te cer-to. E isso era tão claro para mim como respirar. Foi como se me mostrassem tudo. Como funciona e como funcionou.
Sinto meu peito se enchendo de ar como se eu estivesse respirando só aquela hora. Escuto as crianças brincando ao fundo, passos de pessoas, cachorros, bicicletas, sinto a formiga andando sobre minha perna agora. Obro meus olhos. Me impressiono pela coloração. Faz tempo que não vejo o mundo com esses olhos. Me espreguiço. Espero a circulação das minhas pernas voltarem. Me levanto com dificuldade. Ainda sem muita noção de tempo. Nem olho no relógio. Pego minha bicicleta e vou embora. A palavra? Sumiu. A resposta? Não preciso mais dela. Já deu tudo certo.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Sorte. Muita sorte.

Sorte por ter tido um filho maravilhoso e perfeito.

Sorte por fazer o que amo.

Sorte por estar numa agência grande.

Sorte por estar numa agência grande com pessoas de carater grande.

Sorte por conseguir ver meu filho, sempre, mesmo estando numa grande agência.

Sorte pelo que ganho dar para fazer tudo o que preciso.

Sorte por não ter perdido a ponta do dedo num acidente.

Sorte por ter me envolvido num acidente com um motoboy e ele estar vivo e inteiro.

Sorte pelo delegado não ter me prendido por eu estar dirigindo sem habilitação.

Sorte pelo rapaz ser do bem e ainda por cima arrumar um lugar mais barato para consertar a moto dele.

Sorte por dividir uma casa enorme e confortável com uma pessoa do bem que faz um trabalho do bem.

Sorte por ter uma família que me ama e se preocupa comigo.

Sorte por ter uma mãe forte e lúcida.

Sorte por ter um pai do qual eu me orgulho.

Sorte pela mãe do meu filho ama-lo acima de tudo.

Sorte por estudar temas espirituais elevadíssimos com pessoas de um nível elevadíssimo.

Sorte por ter amparadores que estão cuidando de mim. Me amparando.

Sorte por poder enxergar nas dificuldades e obstáculos da vida o que preciso aprender.

Sorte por ter tanta coisa boa envolta de mim.

Sorte por ter a oportunidade de trabalhar coisas boas dentro de mim.

Sorte por aprender tanta coisa em tão pouco tempo.

Sorte por aprender pela dor e pelo discernimento.

Sorte por aprender pela dor e por essa dor ser bem menor do que poderia ser se não fosse a sorte.

Sorte por manter minha integridade, mesmo diante da dúvida e da confusão.

Sorte por enxergar, finalmente, que sou um homem de sorte. De muita, muita sorte.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Que venha.

Que venha o amor, e junto com ele a responsabilidade pelo sentimento do outro.
Que venha a solidão, e junto com ela o desapego.
Que venha a solitude, e junto com ele o auto-conhecimento.
Que venha a dor, e junto com ela o aprendizado.
Que venha a conquista, e junto com ela a consciência de que tudo é passageiro.
Que venha a derrota, e junto com ela a cabeça do ego.
Que venha a vitória, e junto com ela a humildade.
Que venha a doença, e junto com ela a lembrança de que é só o corpo.
Que venha a saúde, e junto com ela a firmeza no dharma.
Que venha a alegria, e junto com ela os olhos brilhantes de Krisna.
Que venha a tristeza, e junto com ela a lembrança da polaridade de Hermes Trismegistro.
Que venha a compaixão, e junto com ela o Bhuda brilhando no coração.
Que venha o equilíbrio, e junto com ele a reverência à Lao T’sé.
Que venha a verdade, e junto com ele a sabedoria de Cristo.
Que venha o que vier, e junto com ele a gratidão, a gratidão e a gratidão.

Namastê.